segunda-feira, 20 de junho de 2011

Incômodos (Esteban Menis)



Na última quarta-feira (dia 15.6.11), extraí os meus sisos. Segundo o Dr. Antônio Carlos Quintão – excelente cirurgião responsável pela operação dentária (recomendo com ênfase aos candidatos à perda de juízo) –, sou um homem de sorte, dotado apenas dos dois sisos superiores. Para mim, esse “privilégio da natureza” era irrelevante porque, com dois-quatro-seis-oito-dez sisos (que fossem), estava decidido a iniciar a empreitada, inebriado (salve 'anestesia!).

Enfim, esse intróito destina-se apenas a relatar que, além do respeito tributado às maravilhas que um grande cirurgião-dentista pode operar em nossas vidas, há um filme ESPETACULAR, que merece atenção: INCÔMODOS (incómodos), do argentino Esteban Menis (2008).




Roteiro bom, personagens interessantes, comicidade dramática de altíssima qualidade, e todos os outros positivos atributos do grande cinema argentino contemporâneo.

Nicolás, Alfred e Abril viajam a Miramar, reduto balneário argentino, com intenções distintas.
Nicolás pretende lançar ao mar as cinzas funerárias do seu avô e aproveita o percurso para uma “escala de reconciliação” (sem sucesso) com sua ex-namorada (Paula).
Alfred participará (solo) de um concurso de dança. Nesse evento, concorrerá com um trio de bailarinos que o havia descartado antes da competição.
Abril visitará a família, após oito anos.
Todos os três protagonistas são personagens solitários e reprimidos, vivem em mundos particulares, inóspitos. Não obstante, a sua patética trajetória (viagem a Miramar) é entrecortada por intervenções delicadas, inseridas para tensionar a rotina medíocre de suas vidas.
Exemplos dessa intervenção:
I. Auxílio de uma freira no conserto do veículo, parado na rodovia com problemas mecânicos.
II. O furto de um pinheiro natalino, que Abril levava de presente à família (apesar de o Natal estar, àquela altura, ainda distante).
III. Sequências MUITO engraçadas tomadas no hotel e no início da estadia em Miramar, como III.I a “receptividade” de uma ranzinza senhora recepcionista (que também coordena o concurso de dança), III.II um restaurante decadente, sem opções de cardápio disponíveis, III.III um giro turístico bem peculiar, guiados por um orgulhoso cidadão de Miramar, que não poupa esforços para enaltecer o potencial econômico da cidade (em franca decadência), etc.
Tudo costurado com maestria por Menis, num ambiente de imagens infantilizadas (cheias de significado), com recurso preponderante de cores primárias, que ressaltam a dificuldade de os personagens (patéticos) adequarem-se aos desafios de um mundo adulto demais, indiferente às suas percepções sensíveis.

E agora, vocês se perguntam: o que “Incômodos” tem a ver com os meus sisos e com a técnica apurada do Dr. A. C. Quintão?

Explico. Inicia-se o filme com o retrato das dificuldades de Nicolás em aceitar a famigerada extração dentária.

Extrair o siso é perder o juízo. Às vezes, a vida apenas se torna suportável sem o siso. No meu caso, os sisos haviam iniciado um processo lento e doloroso de morte, começando por tecidos moles da boca, como as bochechas (calejadas de juízo). Eu, precavido, mandei-lhes à lixeira (1); ainda não estou descartável, como não são descartáveis os adoráveis personagens de Incómodos.

Notas:
1. Sim, eu me preocupei com as pesquisas sobre células-tronco (http://revistavivasaude.uol.com.br/saude-nutricao/91/artigo189637-1.asp)! A doação não foi possível (motivos técnicos: especificidades na conservação do “material”).
2. IMPORTANTE: trailer do filme:



3. ALFRED, esse adorável personagem:

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