sábado, 11 de outubro de 2014

Alberto de Lacerda (2)


Submeti-me
A algo de mais insidiosamente forte ainda do que a brisa

Naveguei na casca de sumaúna rio heraclitiano acima

O pajem formidável dos indícios
Respondeu
                 De nenhures

Sem que eu jamais ousasse
Sequer murmurar
A pergunta fatal

                                 Londres, 13 de novembro de 1996

(Resumo: a poesia em 2010, coletânea de autores, Lisboa : 2010, Assírio & Alvim)

Maria Andresen


Queria o sol tosco inacabado
queria o vento tempestuoso batendo palmas entre as folhas
queria a ignorância, a primeira ideia, o sol

queria a pobreza, o ar, o apodrecimento, a terra
porque o vento do não senso trespassa-nos a vida –– o nexo 
do insensato, do insensível ––
o não senso da vida, o seu nexo

(Resumo: a poesia em 2010, coletânea de autores, Lisboa : 2010, Assírio & Alvim)

Alberto de Lacerda


Murmuro o teu nome ao rés da relva

Murmuro-o
Em diagonal da terra ao céu azul
Radiante

Felicíssimo
Não entendo nada

                              Londres, 28 de dezembro de 1996

(Resumo: a poesia em 2010, coletânea de autores, Lisboa : 2010, Assírio & Alvim)

Daniel Maia-Pinto Rodrigues


Habituei-me a reconhecer os dias quentes
        pela sonolência dos cães.

Há rios de médio porte
        nas zonas baixas das encostas.

Há igrejas de terras pequenas
        com primos no adro.

Neste domingo ponho a hipótese
        de ir ao rio mais próximo.
Neste domingo ponho a hipótese
        de não ir à igreja mais longe.

Considero que já disse
o pouco que queria dizer;

rios que não refrescam,
missas que aumentam o calor.

(Resumo: a poesia em 2010, coletânea de autores, Lisboa : 2010, Assírio & Alvim)

José Emilio Pacheco

INSCRIPCIONES

1

Muro que sin descanso pule el tiempo,
altar de piedra y polvo ya deshecho,
puerta cerrada de un jardín que nunca
ha existido o yace entre sus ruinas,
reino del musgo, losa que se yergue
contra el paso de nadie y bajo el tiempo.

2

Toda la noche se ha poblado de agua.
Contra el muro del día
el mundo llueve.

3

Una vez, de repente, a medianoche
se despertó la música. Sonaba
como debió de sonar antes que el mundo
supiera que es la música el lamento
de la hora sin regreso, de los seres
que el instante desgasta a cada instante.

4

Sobre un espacio del segundo tiempo
deja caer la luz sobre las cosas.

5

Ta devorado por la tarde, el tigre
se hunde en sus manchas,
sus feroces marcas,
legión perpetua que lo asedia, hierba,
hojarasca, prisión
que lo hace tigre.

6

Cierra los ojos, mar.
Que tu mirada
se vuelva hacia la noche
honda y extensa,
como otro mar de espumas y de piedras.

(Los elementos de la noche, Poesía [1958-1964], Madrid : Visor Libros, 2010)