sábado, 31 de março de 2012

Anedotas vulgares romenas (4)

Mapa da Europa

– Papai, adoraria que Paris fosse a capital da Espanha!
– Que ideia! Por quê?
– Foi minha resposta na prova de geografia.

**

Insônia

– Doutor, minha mulher pode tomar ansiolíticos?
– Qual é o problema dela?
– Dorme apenas às cinco da manhã.
– Sofre de insônia?
– Não, mas me espera acordada.

**

Lista telefônica (ou "despistada")

– Oi... Posso saber seu telefone? Posso te ligar amanhã... pra gente conversar, combinar algo; gostaria de conhecê-la melhor!
– Está na lista telefônica.
– Mas... como se chama?
– Meu nome também está na lista. Até amanhã!

Chacal

SÓTÃO

o sótão ficava entre o céu e o inferno.
uma escada nos ligava ao banheiro e ao mundo.
degraus silenciosos.
o telhado mostrava seus segredos
de um buraco eterno no teto.
um armário com todos os livros/chaves
guardava cumplicidade e cupins ruminados.
os filhos malditos disfarçavam em/cruz/ilhadas
bem queimadinhos.
o sol amanhecia esperanças
amarelas e vermelhas nas janelas antigas.
e a vida foi vivida como manda o figurino.


(in muito prazer, 3. ed., Rio de Janeiro: 7Letras, 2010)

Jacques Rigaut

maximes et aphorismes
[110]

Demain, la fin
La fin demain,
A demain la fin
La fin à demain
Demain, à la fin

**

máximas e aforismos
[110]

Amanhã, o fim
O fim amanhã,
Até amanhã o fim
O fim até amanhã
Amanhã, enfim.

(in dadaistes et surréalistes, Gallimard, 2006)

[imagem: Roda de Bicicleta, de Marcel Duchamp]

Gastão Cruz (2)

NUVEM

Nuvem
moves-te
no ar vazio do passado

(in ESCARPAS, Lisboa: Assírio & Alvim, 2010)

Gastão Cruz

NESSE NUNCA

Nunca se pensa que virá um dia
em que essa idade como bruma fria
será a que teremos; todavia

nesse nunca está ela já contida:
se o pensamento desconhece a vida,
dela recebe o sangue da ferida.


(in ESCARPAS, Lisboa: Assírio & Alvim, 2010)

suicídio

despiu-se da carne arrebatada no peito
do sangue de todas as angústias tardias
infindas no tempo-estridor dos dias
calados em dor implodida,
tudo no mais claro intento,
satirizar a morte
e martirizar a vida


(in gavetário, Curitiba: Medusa, 2012)

fashionheptacorde

só a moda
é sadia

soma damas à moda
de sado-soda
aos sem moda

dose de amásia
em demasia

de adamados
mia

eia!


Desmaio.


(in gavetário, Curitiba: Medusa, 2012)

Emily Dickinson (6)

A sepal, petal, and a thorn
Upon a common summer's morn –
A flash of Dew – A Bee or two –
A Breeze – a caper in the trees –
And I'm a Rose!

**

Sépala, pétala, espinho.
Na vulgar manhã de Verão –
Brilho de orvalho – uma abelha ou duas –
Brisa saltando nas árvores –
E sou uma Rosa!


(in 80 poemas de Emily Dickinson, trad. Jorge de Sena, Ed. Guimarães, 2010)

Giselle Vianna

Arranha-céus

Fosse a solidão uma cama nua
violada pelo nada-sopro
de um ventilador de teto
– não arranha-céus à distância
de uma braçada; não,
não chafarizes lado a lado
lançando-se aos ares e recolhendo
sobre si suas gotas. Fosse
o amor um abrir de braços.
Mas eis sobre meu leito a carne
e o osso de teu corpo-memória; eis –
no vão entre tábuas de madeira – o calibre
do tempo
arranhando, exasperado, o assoalho.

(in interpeles, Campinas: Komedi, 2008)

Marin Sorescu

Atavism

Uitatul pe fereastră a devenit un tic,
Toată lumea se uită pe fereastră,
Citeşte, spală, iubeşte, moare
Şi din când în când dă fuga
Şi se uită pe fereastră.

Ce vreţi să vedeţi?
După cine priviţi?
Luaţi-vă gândul, cine a fost de venit a venit,
Cine a fost de plecat a plecat,
Ce a fost de trecut prin dreptul vostru a trecut.

Lăsaţi perdele,
Trageţi obloanele,
Şi mai luaţi-vă o dată tensiunea.

După ce a văzut totul – ploi, războaie,
Soare, cârtiţe, evenimente –
Repetate mereu aidoma,
Omenirea nu cred că mai doreşte serios
Să mai vadă ceva.
Totuşi uite-o lipită de ferestre,
În ochi cu un gol.

**

Atavismo

Ficar à janela virou mania,
Todo mundo fica à janela,
Lê, lava, ama, morre
Dá até uma escapadinha, de vez em quando
E fica à janela.

Que procuram?
Quem esperam?
Não há mais busca, quem devia vir já veio
Quem precisava partir, hoje já está distante
Nada de novo passará diante de nós.

Fechemos a cortina,
Apaguemos as luzes,
Tornemos a sentir apenas – o que passou.

Após ver tudo – guerras, precipitações,
Sóis, eventos e toupeiras –
Que voltam a acontecer iguais,
A humanidade parece extenuada
e não considera seriamente outras coisas.
No entanto, não perde a mania
Fica à janela, debruçada no vazio.


(trad. joão monteiro)

segunda-feira, 26 de março de 2012

Emily Dickinson (5)

By a departing light
We see acuter, quite,
Than by a wick that stays.
There's something in the flight
That clarifies the sight
And decks the rays.

**

A uma luz evanescente
Vemos mais agudamente
Que à da candeia que fica.
Algo há na fuga silente
Que aclara a vista da gente
E aos raios afia.


(in 80 poemas de Emily Dickinson, trad. Jorge de Sena, Ed. Guimarães, 2010)

julgamento

INCONTROVÉRSIA
dos fatos

direito inconteste

ACÓRDÃO:
à unanimidade
não acordar mais

leito P-E-R-E-N-E

Wisława Szymborska (5)

Conversando com a pedra

Bato à porta da pedra.
- Sou eu, me deixa entrar.
Quero penetrar no teu interior
olhar em volta,
te aspirar como o ar.

- Vai embora – diz a pedra. –
Sou hermeticamente fechada.
Mesmo partidas em pedaços
seremos hermeticamente fechadas.
Mesmo reduzidas a pó
não deixaremos ninguém entrar.

Bato à porta da pedra.
- Sou eu, me deixa entrar.
Venho por curiosidade pura.
A vida é minha ocasião única.
Pretendo percorrer teu palácio
e depois visitar ainda a folha e a gota d'água.
Pouco tempo tenho para isso tudo.
Minha mortalidade devia te comover.

- Sou de pedra – diz a pedra –
e forçosamente devo manter a seriedade
Vai embora.
Não tenho os músculos do riso.

Bato à porta da pedra.
- Sou eu, me deixa entrar.
Soube que há em ti grandes salas vazias,
nunca vistas, inutilmente belas,
surdas, sem ecos de quaisquer passos.
Admite que mesmo tu sabes pouco disso.

- Salas grandes e vazias – diz a pedra –
mas nelas não há lugar.
Belas, talvez, mas para além do gosto
dos teus pobres sentidos.
Podes me reconhecer, nunca me conhecer.
Com toda a minha superfície me volto para ti
mas com todo o meu interior permaneço de costas.

Bato à porta da pedra.
- Sou eu, me deixa entrar.
Não busco em ti refúgio eterno.
Não sou infeliz.
Não sou uma sem-teto.
O meu mundo merece retorno.
Entro e saio de mãos vazias.
E para provar que de fato estive presente,
não apresentarei senão palavras,
a que ninguém dará crédito.

- Não vais entrar – diz a pedra. –
Te falta o sentido da participação.
Nenhum sentido substitui o sentido da participação.
Mesmo a vista aguçada até a onividência
de nada te adianta sem o sentido da participação.
Não vais entrar, mal tens ideia desse sentido,
mal tens o seu germe, a sua concepção.

Bato à porta da pedra.
- Sou eu, me deixa entrar.
Não posso esperar dois mil séculos
para estar sob teu teto.

- Se não me acreditas – diz a pedra –
fala com a folha, ela dirá o mesmo que eu.
Com a gota d'água, ela dirá o mesmo que a folha.
Por fim pergunta ao cabelo da tua própria cabeça.
O riso se expande em mim, o riso, um riso enorme,
eu que não sei rir.

Bato à porta da pedra.
- Sou eu, me deixa entrar.

- Não tenho porta – diz a pedra.

(in poemas, trad. Regina Przybycien, São Paulo, Companhia das Letras, 2011)

Emily Dickinson (4)

Of Course – I prayed –
And did God Care?
He cared as much as on the Air
A Bird – had stamped her foot –
And cried “Give Me” –
My Reason – Life –
I had not had – but for Yourself –
'Twere better Charity
To leave me in the Atom's Tomb –
Merry, and Nought, and gay, and numb –
Than this smart Misery.

**

Claro que eu rezei –
Mas Ralou-se Deus?
Tanto Ele se ralou como quando no Ar
Uma Ave – bate o pé –
E grita: Dá-me! –
Minha razão – Vida –
Não tinha tido – só por Ti –
Fora Caridade
Ter-me lá deixado na atómica Tumba –
Alegria e nada, e contente e muda –
Mais que fina Miséria.

(in 80 poemas de Emily Dickinson, trad. Jorge de Sena, Ed. Guimarães, 2010)

quarta-feira, 21 de março de 2012

Emil Cioran (3): prefiro epitáfios a antologias

"Um único dia de solidão representa, para mim, mais felicidade que todos os triunfos desta vida" (Carol Quintul).
**
O fim de uma religião começa quando não nascem mais hereges.
**
Admiro "X" porque não tem ideia do quanto é ridículo.
**
Minhas alegrias são apenas tristezas latentes.
**
Sob o ponto de vista literário, a Justiça é um ideal medíocre.
**
Haverá o dia da abolição do conhecimento e do poder, da renúncia total – ou do capítulo final.
**
Perdi vários velhos defeitos; em compensação, outros novos adquiri. O equilíbrio permanece intacto.
**
A liberdade é igual à saúde: seu valor aquilata-se quando a perde. Àquele que a possui, jamais será um ideal. O mundo livre é um paradoxo.
**
Na França, a insolência é indispensável para construir uma reputação de homem inteligente e espiritualizado
OU
Na França, insolência, inteligência e espírito têm o mesmo valor.
**
Não tenho aptidão alguma à filosofia: interessam-me apenas as atitudes e o aspecto patético das ideias...
**
Meus escritos são todos mancos, sem desenvoltura. Eis o drama daqueles que escrevem pouco, que não escrevem com a frequência da respiração. Sou autor 'de momento', pois escrevo apenas na tentativa de livrar-me da angústia de um instante.
**
Apresento meu aspecto religioso: um fervor demoníaco.
**
Após meu velho entusiasmo (há muito superado) em relação a Rilke, nenhum outro poeta interessa senão Emily Dickinson. O mundo dela, que me é tão familiar, seria ainda mais apropriado se finalmente eu me abandonasse à solidão total. Impossibilitado desse privilégio, prefiro, por ora, fugir de sua poesia.
**
Meu gosto pelas miniaturas, pelas fórmulas condensadas, está bem traduzido assim:
PREFIRO EPITÁFIOS A ANTOLOGIAS.
**
Renunciar a tudo, inclusive ao papel de espectador...
**
A ideia de 'destino' é concebida por homens doentes.
**
Eu o intitulo 'ingênuo' porque, sem tomar consciência de sua mediocridade, jamais hesita e anuncia a todos os louros de sua bobagem. Evidentemente, essa ingenuidade está presente na maioria das pessoas.
**
Nossa confissão mais sincera está nas coisas que especulamos sobre os outros; fofocar é sentar ao confessionário.
**
Nenhum amigo expõe ao outro a realidade. Por essa razão, nossos diálogos mais fecundos desenrolam-se em silêncio com inimigos.
**
Três horas de conversa. Pecado! – perdi três horas de silêncio.
**
Toda afirmação pressupõe uma dose de instinto de que, comumente, não dispomos. Algumas pessoas estão sempre desprovidas de instinto, suas penas são mudez anunciada.
**
Sonho com um sistema filosófico meramente aforístico, como um dia o sonhou Emily Dickinson.
**
A existência de um homem 'livre' prescinde de qualquer coisa, inclusive da honra.


(Cadernos I, prefácio de Simone Boué. Bucareste: Humanitas, 2010)

domingo, 18 de março de 2012

Walt Whitman

FULL OF LIFE NOW

Full of life now, compact, visible,
I, forty years old the eighty-third year of the Sates,
To one a century hence or any number of centuries hence,
To you yet unborn these, seeking you.

When you read these I that was visible am become invisible,
Now it is you, compact, visible, realizing my poems, seeking me,
Fancying how happy you were if I could be with you and become your comrade;
Be it as if I were with you. (Be not too certain but I am now with you.)

**

PLENO DE VIDA AGORA

Pleno de vida agora, concreto, visível,
Eu, aos quarenta anos de idade e aos oitenta e três dos Estados Unidos,
A ti que viverás dentro de um século ou vários séculos mais,
A ti, que ainda não nasceu, me dirijo, procurando-te.

Quando leres isto, eu que era visível, serei invisível,
Agora és tu, concreto, visível, aquele que me lê, aquele que me procura,
Imagino como serias feliz se eu estivesse a teu lado e fosse teu companheiro,
Sê tão feliz como se eu estivesse contigo. (Não penses que não estou agora junto a ti.)


(in Cálamo, trad. José Agostinho Baptista, 3. ed. Assírio & Alvim: Lisboa, 1999)

sábado, 17 de março de 2012

Ana Martins Marques

Falésias

Hoje tivemos
um dia limpo
caminhamos e comemos
em silêncio

buscamos o ponto mais alto
da cidade e falamos
sobre uma casa
que não será construída

falamos sobre essa casa
implantada nas falésias
aberta
aos gritos do mar

falamos
dessa casa
cada vez mais improvável
onde nenhum de nós vai morar

voltamos em silêncio
eu pensando em certos bichos
que só se acasalam
com dificuldade

(in Da arte das armadilhas, São Paulo: Companhia das Letras, 2011)

Elena Liliana Popescu (2)

Aparenţe

În lumea asta
fără de speranţă,
speranţa însăşi
pare-o nebunie,
dar cel
ce-i ne-ntrecut
în cutezanţă
o, cât de mult
ar vrea, nebun
să fie...

(in Pelerin, 2003)

**

Aparências

Neste mundo
desprovido de esperança
a esperança mesma
é uma loucura,
mas ao homem
imbuído
de coragem
ah, quanta vontade
de estar
louco...

(in Peregrino, 2003)

(trad. joão monteiro)

segunda-feira, 12 de março de 2012

Elena Liliana Popescu

Dacă

Dacă s-ar putea vreodată
Să măsori nemăsuratul,
Să cuprinzi nemărginirea,
Să stai, străbătând neantul,
Să fii nici unul, nici altul.

Dacă s-ar putea vreodată
Neiubind să fii iubirea,
Nesperând să fii speranţa,
Nevorbind să fii vorbirea,
Negândind să fii gândirea.

Dacă s-ar putea vreodată
Să auzi neauzitul,
Să priveşti în nevăzut
Şi să afli neştiutul,
Ar urma iar începutul?

**

Se

Se fosse possível um dia
Medir o imensurável,
Abranger o infinito,
Ser, sem justificativas,
Nem isto nem aquilo.

Se fosse possível um dia
Desamar amando,
Esperançar-se desesperando,
Desdizer dizendo,
Atinar desatinando.

Se fosse possível um dia
Ouvir o inaudível,
Dar-te conta do invisível
Conhecer o incognoscível,
Farias tudo novamente?


(trad. joão monteiro)

Nichita Stănescu (2)

Hieroglifa

Ce singurătate
să nu înţelegi înţelesul
atunci când există înţeles.

Şi ce singurătate
să fii orb pe lumina zilei,–
şi surd, ce singurătate
in toiul cântecului.

Dar să nu-nţelegi
când nu există înţeles
şi să fii orb la miezul nopţii
şi surd când liniştea-i desăvârşită,–
o, singurătate a singurătăţii!

(1978)

**

O Hieróglifo

Que solidão
entender o inteligível
apenas quando há intelecto.

Quanta solidão
cegar-se sob a luz do dia, –
ensurdecido, quão recluso
no ápice do canto.

Mas entender
o inteligível
também cega na escura noite
e ensurdece mesmo sob o mais revelador silêncio, –
oh, solidão de solitários.

(1978)


(trad. joão monteiro)

sábado, 10 de março de 2012

over the piano




Over the piano was printed a notice:

"PLEASE DO NOT SHOOT THE PIANIST.
He is doing his best".

(Oscar Wilde)

sexta-feira, 9 de março de 2012

Nichita Stănescu

Autoportret

Eu nu sunt altceva decât
o pată de sânge
care vorbeşte.

(1978)

**

Autorretrato

Sou apenas
um rastro de sangue
que fala.

(1978)


(trad. joão monteiro)

Ana Blandiana

Fiecare mişcare

Fiecare mişcare a mea
Se vede
În mai multe oglinzi deodată,
Fiecare privire a mea
Se întâlneşte cu sine
De mai multe ori,
Până
Uit care
Este cea adevărată
Şi cine
Mă-ngână.
Stăpână,
Mi-e frică de somn
Şi ruşine
A fi.
Pentru mine
Orice răsărit are
Un număr necunoscut de sori
Şi-o singură
Adormitoare
Zi.

(1974)

**

Cada movimento

Cada movimento meu
está refletido
em espelhos múltiplos,
Cada pensamento meu
permanece enclausurado
por muito tempo,
Até
me esqueço
se é real
ou ilusão.
Seguramente,
o sono será perturbado
neste meu ser
envergonhado.
Para mim
cada espectro no horizonte
é signo de incontáveis sóis
de um tardio
e solitário
dia.

(1974)


(trad. joão monteiro)

sábado, 3 de março de 2012

Giuseppe Ungaretti (3)

Canto quinto

Hai chiuso gli occhi.

Nasce una notte
Piena di finte buche,
Di suoni morti
Come di sugheri
Di reti calate nell'acqua.

Le tue mani si fanno come un soffio
D'inviolabili lontananze,
Inafferrabili come le idee,

E l'equivoco della luna
E il dondolio, dolcissimi,
Se vuoi posarmele sugli occhi,
Toccano l'anima.

Sei la donna che passa
Come una foglia

E lasci agli alberi un fuoco d'autunno.

...

Canto quinto

Fechaste os olhos.

Brota a noite
Repleta de fendas impossíveis,
De sonhos mortos
Como sobreiros
De redes lançadas à água.

Suas mãos são sopro
Acenam distâncias inatingíveis
Como as ideias.

E o equívoco da lua
E seu balanço, tão doces,
Se quiseres que eu os fite,
Tocarão minha alma.

És a mulher que passa
Como a folha

E ardem as árvores um fogo de outono.


(trad. joão monteiro)

(in Vita d'un uomo, Milano: Mondadori, 2011)

Anedotas vulgares romenas (3)

Visita-surpresa

– Oh, meu caro, que bela surpresa! Seja bem-vindo! Ficará muito tempo conosco?
– Já que pergunta... ficarei o tempo que vocês quiserem!
– Poxa, que pena... achei que ficaria uns dias mais.

**

Comprinha

– Aonde vai, amorzinho?
– Apenas fazer umas comprinhas, coisa rápida: sal, pimenta, cenoura, abobrinha e uns pares Louboutin. Aproveito e te trago cigarro e uma cervejinha?

Conto anedótico romeno

Perdeu o trem!
(ou A fila anda)

– Que marasmo! Não aguento ficar assim, com nada para fazer. E quando lembro que ainda temos cinco horas de viagem, meu Deus!
– Eu estou tranquilo, vou dormir até lá. Você não trouxe um livro, jornal?
– Não. Nada.
– Até teria trazido o último romance escrito por aquele autor famoso.... como se chama... ?
– Está certo. Na próxima estação, comprarei umas revistas para você.

(...uns minutos depois)

– Por que você está chorando, senhora?
– Meu marido desceu na estação, foi buscar algo para ler e não voltou a tempo; o trem partiu sem ele.
– Sinto muito, senhora! É realmente horrível não ter algo para distrair-se durante a viagem. Faço-lhe companhia?