domingo, 19 de maio de 2013

José Lino Grünewald (2)


quarto escuro

I – encantamento

o belo transpairava vidro a vidro
e céu a céu a lazulita céu a céu
ao reverso refletido o belo corroía
e a vista se feria em filoxeras de alúmen
irisado – movi-me em aves múltiplas
e sol, ar e luas, pássaros céu a céu –
carrossel – baila o sapo no escuro opaco
no escuropaco mais saltita no muxoxo
o tic-tac tic-tac tic-tac salita
o relógio mais solúvel às horas sem relance
e céu a céu a lazulita céu a céu
trazia cigarros de cristal na maresia
de vento a vento soprando volucrinas
zia zia zia zia zi zi zi zi zi z.  iiiii
dissolvidas no volver da persiana

II – vôo

o belo baila e me trespassa – passa
passatravés paralém leva, vela, os lençóis
deleite de luar – o leite bóia no espaço
e lua ao céu voa voa lua ao léu
vogo ao céu – os pés no firmamento
fauna escura, luzir de floralada
leve sortilégio de plumas endormidas
lua ao léu voa voa lua ao léu
papoula – floração de lentejoulas
lua ao léu vago vago lua ao léu
ao céu imenso inseto de alumínio –
tênues antenas, vidro a vidro em espiral até
vidro a vidro sem escuro volta o quarto

III – dia

claro, sol ar, sem lâmpada
cresce o quarto – diuturna melopéia
o relógio pouco a pouco logra o tempo
dia agora as rodas me roendo
as rodas dente a dente me roendo
luz opaca sobrepaira contra o leito
fio a fio a retina romoendo
o relógio pouco a pouco logra o tempo
e o ruído romaria de instrumentos
confraria de metal rugindo rasgando
as rodas dente a dente me roendo
obra e via de janela rio aberto
e o relógio pouco a pouco logra o tempo
e fio a fio rói o tempo fio a fio
rola o tempo que me rói na toca rota

(in Escreviver, Rio de Janeiro: Perspectiva, FBN, 2008)

Nenhum comentário:

Postar um comentário