domingo, 7 de abril de 2013

Daniel Faria (2)


Examinemos um homem no chão
Testemos a transformação de um homem por terra
A sua natureza tão diferente da lava, a sua maneira mineral
De adormecer.
O que mais interessa é ver o seu lugar rodando para perceber o eixo
Que o move no mundo
Ou como pode a sua posição orientar as aves e os astros.

Interessa também a pedra que ele agarra como alimento
Ou que mão escolhe para lhe servir de funda
– se é que não usa a própria boca para lançar o grito.

Examinemo-lo quando desperta para percebermos de onde vem
Para sabermos se o caminho se repete. Se abre os olhos
Prontos a receber imagens ou então como alguém que desmaiou
Ao chocar contra si próprio.
Interessa perceber os motivos da colisão, se acaso
Terá mastigado a pedra até a misturar no sangue.

Examinemos a sua semelhança com um meteoro que cai
Uma fisionomia sem vocação para subir ao céu
O peso do seu corpo quando o nosso olhar o levanta.
Interessa perceber o íman que cria para nós um lugar junto dele
Um lugar dentro dele. Há um olhar que nos desloca –
A placa giratória do amor?

Interessa também o coração que ele agarra como fruto que colhe
Ou que veia abre no corpo para beber
– se não é que é a pedra o que ele bebe com as mãos.

Examinemo-lo como quem sai de casa e vê o seu irmão
Examinemo-lo voltado, em viagem, a orientação discreta
De quem cava no peito a bússola.
Interessa reparar como tropeça no mistério
E se levanta a pedra para compreender.


(in POESIA, Assírio & Alvim, Porto, 2012)

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