sábado, 1 de outubro de 2011

Luiza Neto Jorge (3)

O POEMA

I

Esclarecendo que o poema
é um duelo agudíssimo
quero eu dizer um dedo
agudíssimo claro
apontado ao coração do homem

falo com uma agulha de sangue
a coser-me todo o corpo
à garganta

e a esta terra imóvel
onde já a minha sombra
é um traço de alarme

II

Piso do poema
chão de areia

Digo na maneira
mais crua e mais
intensa

de medir o poema
pela medida inteira

o poema em milímetro
de madeira

ou apodrece o poema
ou se ateia

ou se despedaça
a mão ateia

ou cinco seis astros
se percorre

antes que o deserto
mate a fome



(in poesia, Assírio & Alvim, Lisboa, 2001)

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