quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Wisława Szymborska (2)

Descoberta

Creio na grande descoberta.
Creio no homem que fará a descoberta.
Creio no temor do homem que a fará.

Creio na palidez de sua face,
em sua náusea, no suor gelado sobre seu lábio.

Creio em seus encontros incendiados,
reduzidos a pó,
queimados até a última cinza.

Creio nas cifras dispersadas,
espalhadas sem lamento.

Creio na pressa do homem,
na precisão de seus gestos,
em seu livre arbítrio.

Creio nas lousas fracassadas,
nos líquidos derramados,
nos raios esmaecidos.

Afirmo que acontecerá,
que não tardará
e que ocorrerá na ausência de testemunhas.

Ninguém saberá, disso estou segura,
nem a esposa, nem a parede,
e nem mesmo o pássaro – poderia cantar.

Creio na mão que não se sustenta,
creio na carreira despedaçada,
creio no trabalho de muitos anos desperdiçado.
Creio no segredo levado à tumba.

Estas palavras fazem-me velejar sobre as regras.
Não buscam apoio em exemplo algum.
Minha fé é forte, cega e infundada.


(in Todo caso, Varsóvia, 1972, trad. do italiano: joão monteiro)
(in Ogni caso, trad. italiano Pietro Marchesani, Milão, Libri Scheiwiller, 2009)

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