terça-feira, 3 de junho de 2014

Os sofrimentos do jovem Werther (J. W. Goethe)

21 de novembro

     Ela não vê, não sente que está preparando um veneno que haverá de nos destruir a ambos. E com volúpia sorvo o cálice que ela me oferece para perder-me. Por que o olhar bondoso que me lança tantas vezes – tantas vezes?, não, mas algumas vezes; por que a amabilidade com que acolhe as expressões involuntárias do meu sentimento, por que a compaixão que demonstra ao ver o meu sofrimento? 
 
     Ontem, ao nos despedirmos, ela me estendeu a mão e disse: "Adeus, querido Werther!" Querido Werther! Esta foi a primeira vez que ela me chamou de "querido", e senti-me estremecer. Repeti as palavras centenas de vezes, e ontem à noite, ao deitar-me, falando com os meus botões mil coisas, disse de repente: "Boa noite, querido Werther!" Depois, tive de rir de mim mesmo.
 
22 de novembro
 
     Não posso rezar: "Permiti que ela seja minha!" No entanto, muitas vezes, é como se ela me pertencesse. Não posso rezar: "Dai-a a mim!", porque ela é de outro. Sofismo a minha própria dor, e se não procurasse me controlar eu produziria uma ladainha de antíteses.
 
 
(in Os sofrimentos do jovem Werther, Trad. Marion Fleischer, São Paulo : Martins Fontes, 1998)

Nenhum comentário:

Postar um comentário